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Competências que preparam para a vida

- Marilena Flores Martins -




“Praticamente, 65% dos empregos que as crianças irão ter, ainda não foram criados” – Salman Khan


Todos os que atuam com ou para crianças expressam, por diferentes maneiras, a sua preocupação referente à vida futura das mesmas, principalmente em relação ao seu futuro profissional. Pais, educadores e especialistas não têm como saber, com precisão, quais as habilidades técnicas que elas precisarão adquirir para obter sucesso, tanto na vida pessoal quanto na profissional. No entanto, podemos afirmar que o desenvolvimento de algumas competências e habilidades certamente aumentará as suas possibilidades de sucesso. As crianças precisam saber: se comunicar, trabalhar colaborativamente, se relacionar com diferentes pessoas, serem criativas, perseverantes, flexíveis, pensar criticamente e resolver problemas. Além destas, a aquisição de outras competências igualmente importantes, nos leva a indagar sobre as condições adequadas para que essas oportunidades sejam oferecidas às crianças.

O enriquecimento do ambiente, que inclui o fortalecimento de vínculos afetivos e sociais, principalmente na faixa etária de zero aos seis anos, influencia diretamente no processo de desenvolvimento da criança podendo-se dizer que são fundamentais nessa fase: a estimulação humana, o tipo dos vínculos afetivos existentes e a atmosfera emocional adequada, que, dentre outras, desenvolvem a comunicação verbal e a linguagem, fatores importantes para o aprendizado, para a aquisição de competências sociais e para o controle adequado dos impulsos.


Do ponto de vista do desenvolvimento cerebral, outra pesquisa igualmente importante, realizada pelo Departamento de Psicologia da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos (2012) defende a tese de que crianças agem e pensam como cientistas, uma vez que, mesmo na idade pré-escolar são capazes de tirar conclusões com base em análises estatísticas. Elas também aprendem por experimentos individuais e pela observação dos colegas.

No que se refere às condições ambientais, a interação mãe-criança e a convivência propiciada em ambientes inclusivos e lúdicos contribuem decisivamente para o pleno crescimento do potencial infantil. A sintonia entre os seres humanos se inicia com a ligação mãe-bebê com as primeiras trocas de sorrisos e as primeiras brincadeiras. Este modelo é que irá influenciar as demais brincadeiras humanas.

Daniel Goleman, que popularizou o conceito de inteligência emocional, lembra que: “Alguém emocionalmente inteligente tem quatro características básicas: traquejo social, autoconhecimento, empatia e, acima de tudo, perseverança.” Acrescenta ainda que as habilidades sócio-emocionais são parte de um conjunto de fatores, como o tipo de formação, o interesse em aprender sempre e o apoio da família. A inteligência emocional é mais um elemento do grupo.

Neste aspecto é preciso destacar o aumento de horas em que as crianças, ainda pequenas, ficam na frente das telinhas com resultados negativos para o seu desenvolvimento tais como: obesidade, queda no desempenho escolar e distúrbios do sono. Esses dados são da Academia Americana de Pediatria-AAP (2014), referência para pediatras do mundo todo, inclusive do Brasil. Pesquisa complementar, de julho de 2014, demonstrou que uma TV continuamente ligada em uma sala onde uma criança está envolvida em outra atividade, também a prejudica. Tem impacto na função executiva do cérebro, responsável por várias funções cognitivas como: organização de memória, planejamento e socialização.

Os bebês são os mais prejudicados, pois mesmo em atividades conjuntas nas creches onde a TV fica ligada, podem ficar olhando para a tela, fascinados com sons e cores, mas os seus cérebros são incapazes de dar sentido às imagens, uma vez que o seu repertório interno é limitado com relação às correlações com o mundo exterior. Os pesquisadores reconhecem que o simples hábito de falar, olhando nos olhos dos bebês, conversando e brincando com eles constantemente, se reflete no seu grau de desenvolvimento cognitivo, o que já pode ser notado aos 18 meses de idade. As crianças se parecem mais entre si quando pequenas. Por outro lado, os estudos mostram que elas já se diferenciam no primeiro ano de vida, em função da família, região ou contexto socioeconômico. A fase da linguagem oral, explica problemas no ensino fundamental, mais tarde.

Na oferta de estímulos de toda ordem e nas possibilidades de exploração do ambiente, brincar tem papel fundamental, uma vez que desenvolve a criatividade, a comunicação, o humor, favorece os relacionamentos e permite à descoberta do significado na vida de cada um, aumentando a capacidade da criança de atuar em grupo, assim como as suas competências emocionais para lidar com desafios e frustrações, alicerces importantes da auto-estima. No que se refere à linguagem, assim como nos cuidados com saúde e alimentação, os adultos devem aprender como ensinar seus filhos. Qualquer mãe ou pai tem condições de ajudar: cantando ou explicando imagens, por exemplo.

Esses fatores, certamente, favorecerão o surgimento de indivíduos mais resilientes e equilibrados, com mais chances de sucesso tanto no aprendizado, quanto na sua vida pessoal ou profissional futura, requisitos básicos para a felicidade, segundo Layer. Estudos em diferentes contextos apontam que as pessoas mais bem sucedidas e talentosas são aquelas que brincaram, destacando que elas não separam a brincadeira do trabalho, quando adultas.

Citaremos aqui mais algumas competências emocionais que podem ser desenvolvidas ou fortalecidas enquanto as crianças brincam:




· Confiança em si e no outro

· Coragem

· Paciência

· Persistência

· Tolerância

· Autoconhecimento

· Controle dos impulsos

· Comunicação







· Empreendedorismo

Nos jogos imaginativos com predominância do faz-de-conta, a brincadeira ultrapassa o limite da realidade e constitui um treino para a vida real. Saber avaliar e correr riscos, como por exemplo,andar de bicicleta, escalar um obstáculo, correr e saltar, também podem ser competências importantes para o futuro empreendedor.

· Adaptação A capacidade de se adaptar ao inesperado em diferentes situações com flexibilidade, é igualmente essencial no mundo profissional e pode ser desenvolvida, por exemplo, nos jogos com regras que não só ensinam a criança a perder ou a ganhar, mas também que as regras do jogo podem mudar, em comum acordo com os parceiros.



· Aquisição do conhecimento A disponibilidade para aprender sempre está relacionada à curiosidade infantil, que, com mente investigativa, busca novos desafios, utilizando os jogos imaginativos e o faz-de-conta, como recursos que aumentam e preservam essa competência. O convívio com os livros e as artes torna-se, igualmente, fator de sucesso para a vida dos pequenos.




O brincar pode ainda contribuir para desenvolver nas crianças, habilidades diretamente relacionadas à sua vida futura, tais como as habilidades de convivência e interação.


· Habilidades sociais


As habilidades sociais, associadas à capacidade de negociação e de conviver com as diferenças, constituem competências requeridas no mundo pessoal e profissional e importantes fatores determinantes de sucesso.

A ênfase no brincar como promotor das experiências vividas pelas crianças, principalmente no período que vai até aos seis anos de idade, deverá ter implicações na maneira como se estrutura o ensino infantil que, mais do que nunca, precisa responder positivamente a esse anseio.

Educar uma criança para a liberdade e a autonomia, fatores determinantes para o sucesso de cada um, além de oferecer-lhe as condições adequadas, implica em respeitar os seus tempos e necessidades, concedendo-lhe voz e direito de se manifestar tanto na concordância quanto na discordância, mesmo ainda bem pequena. Isto não significa “deixar fazer o que quer”. É preciso repensar na sua condição de sujeito de direitos e não de objeto da ação, que deve ser ouvido, olhado com respeito, ter a responsabilidade de decidir coisas com as quais já pode arcar, ser compreendido como um ser humano integral, com direitos a serem atendidos por todos os adultos

Referências


COMENTÁRIO GERAL SOBRE O ARTIGO 31 – ONU. Disponível no site:www2.ohchr.org/english/bodies/crc/docs/GC/CRC-C-GC-17_en.doc.

GARDNER,HOWARD. Cinco Mentes para o Futuro. Porto Alegre: ed. Artmed.2008

GOLEMAN, DANIEL. A Inteligência Emocional. 1995. Brasil. Editora Saraiva.

GRUNSPUN HAIM. Criando Filhos Vitoriosos. São Paulo. Editora Atheneu. 2005.

HUGHES P. FERGUS. Children, Play and Development.USA.SAGE Publications.2010.

IPA BRASIL. Agentes do Brincar. Disponível em: www.ipabrasil.org

IPA BRASIL. Artigo 31 da Convenção dos Direitos da Criança. O desenvolvimento infantil e o Direito de brincar. São Paulo, IPA Brasil, 2013.

LAYARD, RICHARD. A Good Childhood – Searching for Values in a Competitive Age. Londres/Inglaterra. Penguin Books.2009

LOUV, RICHARD. Last Child in the Woods. USA. Algonquin Books. 2005.

MARTINS,FLORES, MARILENA. Brincar é preciso! São Paulo: IPA Brasil, Ed. Evoluir Cultural,2009.

MARTINS, FLORES, MARILENA; TALBOT, PREST, JANET; THORNTON LUCY. A Chance to Play. O Direito de Brincar. Diadema. Hannay Empreendimento Social. 2013. Disponível em : www.a-chance -to-play.org.

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