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  • Os desafios da desmedicalização da vida

    - Mônica Takei Hasimoto - Ao longo do curso formativo de Agentes do Brincar, muitos pensamentos foram surgindo que se entrelaçam com a minha prática profissional na saúde mental infanto juvenil. Percebi muitas questões referentes a banalização do brincar, diante de um “transtorno mental” e o quanto o diagnóstico médico atravessa as esferas da vida. Desse modo, esbarrei no termo “medicalização” e na reflexão sobre o brincar e a criança em sofrimento mental. O termo medicalização, de acordo com o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade: Entendemos por medicalização o processo em que as questões da vida social, sempre complexas, multifatoriais e marcadas pela cultura e pelo tempo histórico, são reduzidas à lógica médica, vinculando aquilo que não está adequado às normas sociais a uma suposta causalidade orgânica, expressa no adoecimento do indivíduo. Assim, questões como os comportamentos não aceitos socialmente, as performances escolares que não atingem as metas das instituições, as conquistas desenvolvimentais que não ocorrem no período estipulado, são retiradas de seus contextos, isolados dos determinantes sociais, políticos, históricos e relacionais, passando a ser compreendidos apenas como uma doença, que deve ser tratada. Assim, a medicalização da vida é um conceito mais amplo e complexo do que somente o aumento do uso de medicamentos. É um conceito que determina uma única lente (médica-biológica) para discutir as questões humanas. Em saúde mental, existe um histórico de uma extensão do que é pensado para os adultos para as crianças e adolescentes, sem levar em consideração as particularidades e peculiaridades das outras fases da vida (Guarido, 2007). A medicalização dos cuidados do adulto não é diferente, está presente principalmente na nomeação de comportamentos, na negação da “desobediência” e no julgamento moral da subversão da criança, na naturalização do sofrimento e na culpabilização individual. Todos os “fazeres” fora do padrão, são definidos como diagnósticos médicos, com tratamentos e prescrição de medicamentos. Desse modo, a criança acaba direcionada por diversos “tipos” de terapia, uma enxurrada de atividades direcionadas e um cotidiano guiado demais, sem espaço para o seu desenvolvimento potente e livre. O brincar se enrijece e dá lugar a itens de estimulação específicos, a ambientes seguros e cheios de cuidados. É importante destacar que a criança em sofrimento pode transparecer suas questões no brincar, a falta de brincar ou mudanças no seu fazer cotidiano. Entretanto, o recorte proposto nesta discussão é a criança e a medicalização do brincar. Ao longo da minha prática profissional com crianças e suas famílias, pude coletar em minha memória angústias, dúvidas e reflexões: “Ele só fica balançando os braços e pulando, não brinca porque ele tem problema né”, “Não deixo ele ir ao parquinho, ele vai comer alguma coisa da areia!”, “Ela faz várias terapias e atividades durante a semana e em casa nós também damos vários exercícios para ela fazer”, “deixamos ela brincando separado das outras crianças da sala da escola”, “Ele não para quieto, não se concentra, não brinca de nada”. Estes são depoimentos comuns entre pais, familiares e instituições sobre crianças em tratamento de saúde mental. Percebo que a ânsia por definir a singularidade dos sujeitos se encaixa com os diagnósticos médicos na infância que vão criando fendas nos territórios do sujeito. Guarido (2007) argumenta que a medicalização das crianças nos tempos atuais pode ser lida também como um silenciamento dos conflitos, vetando-os como inerentes à subjetividade e ao encontro humano. Azevedo (2018) se alinha com esse pensamento e argumenta que a medicalização se torna cada vez mais um mecanismo que tampona a diversidade. O olhar sob as crianças envolve cuidados médicos e pedagógicos, mas não se restringe a eles (Azevedo, 2018). Ao invés de uma resposta única, como ampliar o território do brincar e dar lugar para as singularidades? Talvez, ao invés de nos ancoramos em respostas, podemos olhar para as perguntas, para o que provoca… A criança fica pulando? Ela pula quando está feliz ou quando parece triste/incomodada? Vamos brincar com o pular? Ele não se concentra? Mas em que momentos fica mais difícil? Quais tipos de atividades percebemos maior concentração? É importante considerar que a discussão sendo em um país extremamente desigual como o Brasil, não é possível falar sobre o tema sem trazer a luz a desigualdade e o desafio de não nos orientarmos pela concepção burguesa de criança que não corresponde com a realidade (Neto, 2019). Neto (2019) ressalta que é preciso estar atenta a discussão da criança e da infância romantizadas e provocar politização, historicização e crítica dos processos (desigualdades, racismo, machismo, meritocracia, etc). Só assim, o brincar é convocado a fazer parte das ações desmedicalizantes. Lembrar sempre que o brincar nunca está descolado do ambiente e da sociedade que é pelo brincar que acontece a aprendizagem social. Apresenta-se aqui, uma luta constante contra formas hegemônicas de se debruçar nas discussões sobre o brincar, a criança e os processos sociais. É importante destacar que existem limites e nada é a salvação da luta contra a desmedicalização (Neto, 2019). Reconhecer a pluralidade e a complexidade das questões humanas é o primeiro passo para encarar os desafios. Precisamos tensionar a lógica vigente e multifacetar as nossas perguntas e as nossas respostas (Neto, 2019). O desafio está na construção de alternativas desmedicalizantes inseridas em processos coletivos. Como no Conto da Ilha Desconhecida de Saramago (1998), a jornada nos fortalece e pelo caminho trilhado aprendemos a navegar. Muitas vezes encontraremos o absurdo, pessoas que não concordam com a rota traçada, as boas parcerias, as tempestades, terras firmes um tanto quanto questionáveis, mares azuis que se confundem com o céu e tantas outras maravilhas e intempéries. Acredito que a desmedicalização da vida é isso. A luta pelos direitos (de brincar e todos os outros) acontece no coletivo e que também reverbera em cada um. Estamos todos navegando, cada um em sua ilha desconhecida, encontrando outras terras e cartografando nossos brincares, afetividades, memórias... A jornada pela procura de nós mesmos e pelo desconhecido e misterioso que é a troca e a história do outro. Não importa se nos referimos à complexidade com que Saramago (1998) escreve sobre o ser humano ou ao velho ditado (estamos todos no mesmo barco), o barco navegará. Finalizo aqui um texto um tanto quanto confuso de ideias, reflexões e indagações. São muitos questionamentos que o curso provoca, mas entendo que tentar traduzir esses processos em palavras é um exercício importante. Percebo essa importância quando presenciamos a diluição das palavras nas práticas enrijecidas do cotidiano. Este é um poema que acolheu muito a minha equipe no trabalho e gostaria de compartilhar. A menina ri a gente ri junto Ela chora e a gente não Ela pede remédio a gente não dá A menina pede palavras a gente oferece A menina ameaça a gente se cala A menina diz que não nos quer mais E a gente diz que continua querendo ela. (Autor: anônimo, poema apresentado no Fórum Internacional de novas práticas em saúde mental infantojuvenil 2019) Referências Bibliográficas AZEVEDO, Luciana Jaramillo Caruso de. Medicalização das infâncias: entre os cuidados e os medicamentos. Psicol. USP [online]. vol.29, n.3, pp.451-458, 2018. FÓRUM sobre a medicalização da educação e da sociedade. [on-line] in: http://medicalizacao.org.br/ GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.33, n.1, p. 151-161, jan./abr. 2007. NETO, Hélio da Silva Messeder. VAMOS BRINCAR DE (DES)MEDICALIZAÇÃO? Revista Práxis Educacional, Vitória da Conquista–Bahia –Brasil, v. 15, n. 36, p. 224-244, 2019. SARAMAGO, José. O conto da ilha desconhecida. – São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

  • Desenvolvendo o aspecto motor e intelectual

    - LUCIANA ORTIZ KFOURI - O brincar deve auxiliar no desenvolvimento motor e intelectual, além de ser responsável por parte do desenvolvimento pessoal e emocional (ensinando coisas como o respeito às regras, trabalho em equipe e lidar com a frustração de perder). Brincando, a criança aprende a agir na esfera cognitiva, sendo a brincadeira uma transição entre as situações da infância que são reais e o pensamento adulto. Sabendo o tamanho da importância do direito de brincar, deve-se levar em consideração também as diferentes etapas do desenvolvimento e o fato de que cada criança se desenvolve em um ritmo diferente (e com suas preferências individuais), ao mesmo tempo em que devemos estar atentos à igualdade em oportunidades para brincar (seja relacionada à gênero, raça, classe, capacitismo etc.) para assegurar que o Artigo 31 da Convenção dos Direitos da Criança da ONU (“Toda criança tem o direito ao descanso e ao lazer, a participar de atividades de jogo e recreação apropriadas à sua idade e a participar livremente da vida cultural e das artes”) e o Artigo 227 da Constituição Federal brasileira (1998) sejam respeitados. De acordo com o Guia “O direito de brincar de todas as crianças”, feito pela Rede Nacional Primeira Infância (2014), existem algumas condições básicas para que o direito de brincar seja plenamente assegurado: (i) efetivar políticas públicas (que garantam o exercício do direito de brincar e difundam as garantias legais existentes); (ii) ampliar a informação e comunicação para todos os públicos (em relação à importância do brincar para o desenvolvimento infantil); (iii) assegurar a oferta de espaços adequados (se atentando às condições dos espaços físicos e relacionais); e (iv) promover a formação e o empoderamento dos Agentes (guardiões do direito de brincar das crianças que promovem para todas as crianças – sem exceção – oportunidades lúdicas com conhecimento, qualidade e sustentabilidade). Compreendidas como planos governamentais, as políticas públicas que têm como objetivo atuar na área da infância costumam sofrer diversos empecilhos, entre eles a falta de profissionais qualificados e a falta de recursos financeiros. Hoje, é preciso compreender a infância como algo dinâmico, que se constrói diariamente dentro de um contexto socioeconômico e político e que deve ser alvo e objeto de políticas públicas sérias e adequadas à realidade. Diante disso, as indústrias, ONGs e grupos organizados de profissionais da sociedade civil se debruçam sobre as ciências sociais a fim de compreender os novos cenários e encontrar soluções para auxiliar o poder público, pois sabe-se que a avaliação e monitoramento de projetos são grandes desafios para a otimização do uso de recursos em ações sociais mais eficientes. Segundo a Unesco, a educação se torna indispensável à humanidade na construção de novos ideais caracterizados pela paz, pela liberdade, pela igualdade de oportunidades e pela justiça social. Como o mundo está em constante mudança, a educação também deve ser dinâmica (como a infância) e durar por toda a vida. A educação do ser humano engloba o brincar, pois também é por meio dele que se aprende a cultura dos mais velhos; no entanto, a brincadeira ainda é o inverso do trabalho (e, infelizmente, da maioria da educação nas escolas) pelo fato de ser escolhida (Carneiro e Dodge, 2007). Para que o brincar seja inclusivo e diverso, devemos levar em conta as nossas diferenças de aparência, de habilidades, de interesses e de idade (entre outros), lembrando sempre que as pessoas se complementam e dependem umas das outras. Na sociedade em que vivemos, com grande competitividade e com uma visão de mundo dualista, o brincar ensina a convivência com os outros, a cooperação e a comunicação (juntamente com o desenvolvimento da linguagem), podendo diminuir os índices de conflito e violência. Para que uma criança (com deficiência ou não) se sinta aceita e incluída, ela deve ser ouvida e respeitada como sujeito de direito; deve sentir-se parte de um grupo/comunidade/mundo. Logo, há muito mais no brincar do que apenas o desenvolvimento físico, mental e emocional: há o afeto, o estímulo e o reconhecimento do outro e no outro. Segundo Martins (2009), desde os primeiros meses de vida a criança se inclui no mundo por meio dos vínculos que estabelece com as pessoas à sua volta (principalmente seus cuidadores); isso é uma necessidade básica que permanece durante toda a vida. Ao brincar, conseguimos adquirir os conceitos de valores fundamentais (como confiança, honestidade, cuidado com o próximo, tolerância etc.), criatividade, sustentabilidade, senso de pertencimento, limites e responsabilidades. De acordo com a autora, o brincar é um espaço em que as crianças podem descobrir o próprio significado da vida e serem elas mesmas, e os brinquedos e brincadeiras fazem parte do imaginário infantil, contribuindo para a educação e servindo de instrumentos para a inclusão da criança em todos os ambientes e para a sua interação com os demais (o que, infelizmente, muitas vezes não acontece com crianças com deficiências físicas, intelectuais ou sensoriais ou com distúrbios psicossociais). Uma das classificações, tanto para os brinquedos como para as brincadeiras, proposta por estudiosos do tema é: (i) jogos exploratórios (são a base para desenvolver outras habilidades por meio da exploração de diferentes formas, sons, cores etc.); (ii) jogos sociais (com a participação de um ou mais parceiros no novo, desenvolvem a capacidade de negociação); (iii) jogos ativos (desenvolvem a capacidade motora pelo uso do corpo); (iv) jogos de habilidades (estimulam a mira, o raciocínio ou a montagem de algo); e (v) jogos de faz de conta (com a imaginação e a criatividade, auxiliando na compreensão da realidade por meio do simbolismo). No contexto de pandemia, entre os vários desafios enfrentados pelo isolamento social esteve a convivência com as crianças dentro de casa por mais tempo (devido ao fechamento das escolas). Essa mudança na rotina não diz respeito apenas aos adultos, mas também às crianças, que são afetadas principalmente pela restrição da convivência e ausência das demais relações humanas (que são necessárias para que elas se desenvolvam plenamente como sujeitos). De acordo com Gaudío (2020), “além da socialização, a criança precisa de atividades para desenvolver sua coordenação motora e suas habilidades cognitivas”, também alteradas. A psicóloga afirma que a quarentena pode ter gerado bastante ansiedade na criança, interferindo em seu sono, apetite, na sua respiração e em seu humor. Nesse sentido, é de extrema importância que os adultos estejam dispostos a passar um tempo brincando junto com as crianças e estimulando-as, para que elas possam desenvolver sua confiança, segurança e autonomia, garantindo assim uma melhor integração de experiências físicas, sociais e psicológicas. Ainda segundo a entrevistada, “é bom estimular a criança a fabricar seu próprio brinquedo, a usar a sua imaginação e criatividade”, pois brinquedos muito automáticos ou tecnológicos contribuem pouco para o seu desenvolvimento; é importante também que a criança tenha oportunidade de projetar seus sentimentos, seja com desenhos, com um diário, dançando, praticando atividades físicas ou fazendo uso de dispositivos eletrônicos (em vídeo chamadas com amigos e familiares). Segundo Tourinho Filho (2020), “uma criança que não brinca é um adulto que não pensa”; logo, é imprescindível fazer com que a criança se interesse pelas brincadeiras tradicionais durante o brincar intergeracional, pois é necessário “desafiá-la e torná-la protagonista na proposta da brincadeira, até mesmo trocando o jogo eletrônico pelo similar tradicional”. Pode-se concluir que os cuidadores, educadores e Agentes do Brincar precisam compreender os benefícios motores, intelectuais, sociais e emocionais do brincar, além de entender que cada criança possui seu próprio desenvolvimento (e seu próprio gosto e forma de brincar) e merece ser respeitada para que faça suas descobertas no seu próprio tempo. No mundo de hoje, principalmente no contexto atual do isolamento social, precisamos entender que o ato de brincar deverá ser controlado pela criança e sempre considerar as suas necessidades, seja em uma brincadeira tradicional ou em brincadeiras envolvendo tecnologia. O desenvolvimento na infância proporcionado pelo brincar fica com o sujeito por toda a vida (assim como as memórias), e já que as relações de afeto influenciam diretamente as experiências da criança por meio das brincadeiras, é dever de todos nós como sociedade preservar e transmitir esses valores fundamentais e garantir as oportunidades ideais para que o brincar aconteça (proporcionando ambientes favoráveis e as adaptações necessárias). REFERÊNCIAS Carneiro, Maria Angela Barbato e Dodge, Janine J. A descoberta do brincar. Editora Boa Companhia, 2007. Gaudío, Luciana. Você sabe qual a importância do brincar em tempos de isolamento social? [Entrevista cedida a] Sou BH, Belo Horizonte, 05/06/2020. Disponível em: https://www.soubh.com.br/noticias/viva-bem/voce-sabe-qual-a-importancia-do-brincar-em-tempos-de-isolamento-social. Acesso em: 29/07/2020. Martins, Marilena Flores. Brincar é preciso!: guia para mães, pais, educadores e para quem possa interessar... São Paulo: Evoluir Cultural, 2009. Rede Nacional Primeira Infância (RNPI). Guia: o direito de brincar de todas as crianças. Plano Nacional da Primeira Infância (PNPI/RNPI), Ação Finalística: “O direito do brincar, ao brincar de todas as crianças”. Outubro, 2014. Tourinho Filho, Hugo. Crianças devem ter rotina para brincar em isolamento social. [Entrevista cedida a] Ferraz Jr. Jornal da USP, 15/04/2020. Disponível em: https://jornal.usp.br/atualidades/criancas-devem-ter-rotina-para-brincar-em-isolamento-social/.

  • BRINCAR COM A NATUREZA

    - Norma Dias da Silva - "Brincando com o que se tem ao redor" O brincar com a natureza contribui de uma maneira bastante significativa no desenvolvimento da criança. Podendo ir além, colaborando não somente em sua primeira infância, mas estendendo-se para a vida. Quais contribuições são essas? Por que faz toda a diferença esse convívio com o meio natural? Em que situações podemos proporcionar esses momentos às crianças? Existem muitas perguntas relacionadas à temática. O contato com a natureza desperta diversos estímulos, proporcionando criar, recriar, inventar, imaginar, descobrir, sentir, sonhar, dentre outras ações, trazendo benefícios relevantes. O convívio social se fortalece, a sensibilidade permite ir além do que se tem em mãos. O simples graveto, a pequena pedra, a folha seca, o galho torto, o vento forte , a água, a terra entre outros elementos naturais se tornam ricas ferramentas para grandes experimentos. Segundo o pesquisador Gandhy Piorski, a brincadeira se faz com a vida, e não com produtos comprados. Achei fantástica a afirmação citada, pois, a vivência no dia a dia da criança, o toque com os objetos e elementos naturais permitem muitos aprendizados de valores humanos, oportunizando uma percepção de mundo que está ao redor da criança. “É a criança que brinca imaginando ou é a imaginação que brinca a criança? O questionamento levou G.P a pesquisar a infância e o brincar na natureza. As pesquisas realizadas, trouxeram muitas reflexões, mas não chegou a uma resposta. Porém, constatou que há quatro elementos da natureza, que são essenciais no desenvolvimento integral da criança. Piorski, afirma que brincar com elementos naturais é uma forma de conhecimento. A água, o fogo, a terra e o ar, são elementos citados em suas pesquisas, onde sinaliza que somos formados por eles. Exemplifica como podem contribuir para o progresso da criança. Piorski acredita que levar para a água crianças que dão muitos tapas, murros ou quebram coisas, pode ajudá-las a fluir, a aprenderem a ser menos abruptas. “E têm os elementos que tonificam. Quando a criança é muito tímida e introspectiva, o fogo pode ajudá-la”, explica. Neste contexto, realmente podemos entender e destacar a importância da criança em convivência com o meio natural. BRINCANDO COM ELEMENTOS NATURAIS TERRA AR FOGO ÁGUA O pesquisador ainda destaca que brincar com os quatro elementos não há uma divisão quando a criança brinca na natureza, mas dependendo da atividade proposta, um ou outro pode se sobressair. Também nessa perspectiva não existe uma criança da “água” ou “ar”, mas um indivíduo dotado de imaginação que, em momentos diferentes, anseia por uma vivência maior com um elemento específico, seja para reforçá-lo ou equilibrá-lo dentro de si. Outra pesquisadora que pode traz contribuições, é Ana Lucia Machado, fundadora do site: educandotudomuda. A escritora e pesquisadora da infância, também argumenta e afirma que o melhor brinquedo do mundo para a criança é a própria natureza - brinquedo bom, bonito e barato, acessível, ao alcance de todos. A escritora declara que os centros urbanos, tem tirado de todos nós, o que não tem custo financeiro, a liberdade e a convivência familiar. Machado, convida a todos para um investimento na infância ao ar livre, com menos coisas e mais vivências sensoriais. Um convite para um resgate do dia a dia mais simples e natural, com mais leveza, escuta e calor humano. Completa ainda que as vivências, explorações, descobertas e brincadeiras ao ar livre, colocam a criança em contato com as forças vitais dos elementos naturais, com ciclos de vida e morte. As contribuições de Ana Lucia, nos leva a reflexões mais profundas de sentimentos, essências de um ser. BRINQUEDO CHAMADO NATUREZA Como fundadora do site EDUCANDOTUDOMUDA, ela convida a todos para refletirem sobre o Poema, bastante significativo. O menino rico Nunca tive brinquedos. Brinco com as conchas do mar E com a areia da praia; Brinco com as canoas dos coqueiros Derrubados pelo vento; Faço barquinhos de papel! E minha frota navega Nas águas da enxurrada; Brinco com as borboletas nos dias de sol. E nas noites de lua cheia Visto-me com os raios de luar. Na primavera teço coroas de flores perfumadas. As nuvens do céu são navios, são bichos, são cidades. Sou o menino mais rico do mundo, Porque brinco com o Universo, Porque brinco com o infinito. (Maria Alceu N. S. Ilnzinger) O Poema citado só agrega aos argumentos explanados dos autores Piorski e Ana Lúcia, valorizando e incentivando o brincar ao ar livre. Em meio a tantas construções e brincadeiras tecnológicas cada vez mais intensa, o brincar com a natureza, acaba deixando de ser uma prática no cotidiano das crianças. Mas convido aos leitores deste artigo que saem em busca, ofereçam este bem à seu filho(a). Existe inclusive Projeto que cria área verde em cidades, para o incentivo do brincar na natureza, por ser benéfico. Pintura e colagem com elementos naturais Peça para que as crianças escolham algumas folhas, gravetos, pedras e elementos naturais que chamem sua atenção. Disponibilize tintas coloridas, uma folha branca. Em seguida, peça para que desenhem no papel usando os objetos escolhidos. Novas e diferentes formas surgirão de cada elemento. Outra possibilidade é fazer uma colagem com as folhas e flores coletados. Usando papel, fita adesiva e cola, as crianças podem criar formas e padrões sobrepondo os elementos. Caça ao tesouro Em uma praça ou parque, observe um elemento natural e descreva-o para que as crianças tentem encontrá-lo. Adapte a quantidade de detalhes fornecidos de acordo com a idade das crianças. Para os mais novos, pode ser algo mais direto, como “encontre uma flor amarela”. Para os mais velhos, o desafio pode ser maior, como “encontre um elemento que possua formato oval e bordas irregulares”. Arco-íris natural Escreva em uma folha as cores do arco-íris: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil (azul escuro) e roxo. Peça para que as crianças encontrem itens na natureza que correspondam a essas cores, e formem seu arco-íris natural. Se na região não houver tanta variedade de cor, proponha que as crianças montem um degradê da cor verde, por exemplo. Fósseis de plantas Peça para as crianças formarem pequenos círculos achatados com massinha de modelar (https://www.cleanipedia.com/br/familia/massa-de-modelar-aprenda-a-fazer-a-sua-massinha-em-casa.html). Em seguida, pressionem em cima deles flores, folhas e plantas – ou ainda objetos como pinhas, gravetos e o que mais acharem pelas redondezas. Diante de tudo que foi sinalizado, posso concluir e reafirmar que a partir do momento que oportunizamos às crianças a chance de convivências e conexões com o meio natural, permitimos o pé no chão literalmente, onde ela é fortalecida na sua essência. Despertando o sentimento de pertencimento e reconhecimento do seu eu. Estando conectada, proporcionando um aprendizado para a vida, que não é ensinado por ninguém. Fazendo descobertas que contribuirão para desenvolvimento da autonomia, enfrentamento de riscos que surgirem no seu cotidiano, se tornando confiante para ações perante adversidades da vida, em sua fase adulta. Transformando-as e Tornando-se um ser feliz verdadeiramente. Conclusão Partindo desses pressupostos aqui registrados, sabemos quantas contribuições o brincar com a natureza, proporciona para uma criança. Portanto se você tem um filho(a), sobrinho(a), amigo(a) ou encontrar uma criança, que tal oportunizar um momento de alegria e movimento do corpo? Seguem algumas atividades, como sugestões, para brincar na natureza. Com baixo custo ou algo que já tem em casa, rendendo muitos conhecimentos e experiências para a vida. Importante lembrar que os elementos naturais devem ser usados os caídos no chão, para preservarmos o meio ambiente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ð PIORSKI,Gandhy- Brinquedos do Chão: a natureza, o imaginário e o brincar-Ed. Peirópolis- 2016 ð Site-EDUCANDOTUDOMUDA.COM.BR-MACHADO,AnaLúcia Fundadora da Plataforma da http://www.educandotudomuda.com.br/ – focada em projetos educacionais de cuidados e de valorização da primeira infância e de reconexão da criança à natureza. ð Centro de Referência em Educação Integral ð Site- Programa Educação e Território

  • O brincar no século XXI

    - Karol Romão Rodrigues Veroneze - A sociedade em que vivemos valoriza a superexposição de tudo o que se faz. E no caso das crianças a super valorização está focada no quanto a criança está ocupada com atividades que possam agregar na sua vida. Afinal, quanto mais atividades, mais “conhecimento" essa criança terá. E assim seu currículo já começará a ser lapidado precocemente. No entanto, a sociedade parece esquecer, ou simplesmente ignorar, como a infância é um dos períodos de maior aprendizado de uma pessoa. E o quanto essa fase pode ser transformadora na vida de qualquer ser. É notório que o nosso mundo está doente em diversos aspectos, mas também é fato que a mudança pode começar na simples atitude que temos com as crianças. Dar importância e oportunidade pelo livre brincar já seriam os primeiros passos para essa mudança? Ou só isso não bastaria? Mas para que qualquer transformação aconteça o primeiro passo precisaria ser dado, o livre brincar precisa ser mais valorizado e difundido, pois poucos realmente sabem o quanto ele pode agregar para a vida das crianças. Especialmente por estarem em uma fase de desenvolvimento. Por isso, inclusive, muitos médicos passaram a indicar “o brincar como um remédio” pois já foi comprovado que existem inúmeros benefícios. Em 2018, a Academia Americana de Pediatria ratificou essa tese com a publicação de um artigo científico, recomendando que a brincadeira é o melhor remédio para o desenvolvimento das crianças. Pois é por meio dela, de acordo com cada faixa etária, que conseguiremos promover o aprendizado de habilidades de cognição até as socioemocionais, além do aperfeiçoamento de habilidades motoras, entre outras, que trazem diversos estímulos importantes. Hoje em dia nós vemos cada vez mais as crianças deixando de brincar ao ar livre para ficar interagindo no celular ou jogando jogos na internet, tablet e outras mídias eletrônicas. Por mais que essas tecnologias façam parte das nossas vidas, nós não podemos permitir que elas prevaleçam (sob) sobre o tempo do brincar. Segundo dados apresentados pela Revista Crescer em 2019 “82% dos entrevistados pensam que os filhos brincam menos do que eles próprios quando eram crianças e 70% concordam que os pequenos não têm tempo suficiente para se divertir”. Fonte: Pesquisa Play Under Pressure (Brincar sob Pressão, em tradução livre), realizada pelo Museu das Crianças de Minnessota (EUA), com mais de mil pais e mães. Essa pesquisa exemplifica o quanto precisamos incentivar o brincar das crianças, dar oportunidade para que ela conheça o mundo por outras perspectivas, além do que é possível por meio de uma interação eletrônica/virtual. É claro que, em alguns momentos, o meio digital se faz necessário, como o que vivemos com a pandemia do coronavírus. Mas não podemos esquecer de que tudo é questão de equilíbrio. Saber dosar e organizar o tempo para criarmos uma rotina que foque também no brincar é essencial para o desenvolvimento infantil. E se não for possível ter esses momentos num ambiente como uma área verde ou parque, já que o contato com a natureza traz experiências riquíssimas, que pelo menos esses momentos possam permitir o explorar, o descobrir, o aprender e o experienciar. Afinal, a forma mais simples de uma criança aprender é brincando. A linguagem da criança é lúdica. Enquanto estamos nessa fase de isolamento social com as crianças em casa, a psicóloga Rosely Sayão sugeriu (em matéria para o Jornal Folha de São Paulo do dia 18 de março de 2020 – auge da pandemia do coronavírus) que soltar a imaginação e até transformar os afazeres domésticos em brincadeiras, seria uma oportunidade de brincarmos com as crianças. Além de ser mais uma brincadeira para tirar as crianças da frente das telas e proporcionar o brincar de outras formas, também promove a aprendizagem sobre a dinâmica da casa com ludicidade. O poder do brincar E foi acreditando no poder do brincar que a comunidade internacional deu início à trajetória do brincar como direito humano. Em 1959 institui-se a Declaração dos Direitos da Criança. Anos depois, mais precisamente em 1989, esse direito foi fortalecido com a Convenção dos Direitos da Criança. É por meio deste documento criado na Convenção que temos o artigo 31, que foca justamente no desenvolvimento infantil e o direito de brincar. Mesmo com essas diretrizes, ainda era preciso de mais incentivos públicos para tornar a corrente do brincar mais forte. Unindo esforços seria possível promover ainda mais discussões, reflexões e engajamentos, para assim criar propostas que visem ao direito das crianças. Com esse objetivo, os deputados trouxeram luz às questões como “envolver as crianças de até seis anos na formatação de políticas públicas, a ampliação da licença paternidade, além de também garantir o direito ao livre brincar, entre outros”. Assim foi criado o marco legal (lei 13.257 de 08 de março de 2016) com foco pela primeira infância – de 0 a 6 anos – que é tido como período em que as primeiras conexões neurais são formadas. Tudo o que se constrói nessa etapa da vida se refletirá nas ações deste adulto no futuro. Com essa lei, a ciência tornou-se aliada da causa, podendo assim, contribuir com a criação de projetos para o público infantil. Outro ponto a se considerar no poder do brincar está na necessidade de ouvir as nossas crianças. Mesmo em algumas faixas etárias em que a linguagem não está tão desenvolvida, o brincar permite a comunicação por outros métodos. E isso vai contribuindo para o relacionamentos dos pequenos com suas famílias, fortalecendo as relações com o primeiro núcleo social que pode, assim, trazer benefícios para todas as relações. Na pesquisa realizada pelas autoras Dodge, Janine e Carneiro, Maria Ângela, no livro “A descoberta do brincar”, foi possível constatar o quanto as crianças estão cada vez mais inertes, envolvidas com o estímulo da televisão e de videogames. Além disso, as próprias crianças tiveram oportunidade de relatar o quanto o brincar é primordial para elas e seus responsáveis não compreendem essa necessidade. Sendo que alguns adultos podem agir dessa forma por estarem focados, principalmente, nos seus trabalhos e obrigações. Por mais que as causas dessa questão possam ser inúmeras, é possível promovermos mudanças. Ao questionarmos nossas ações com as crianças já criamos uma onda pela transformação das nossas relações com nossos filhos, sobrinhos, alunos, etc. A tomada de atitude, dando oportunidade ao livre brincar e também auxiliar a criança na valorização desse momento, fará com que no futuro possamos ter relações mais saudáveis em nossa sociedade. Cada um de nós é responsável por plantar a semente do brincar, para assim despertamos a humanidade do efeito inconsciente que hipervaloriza a qualidade de um currículo precoce e atividades extras, em detrimento a todas as relações. Afinal, o poder do brincar transcende qualquer barreira e só tem a agregar no desenvolvimento infantil. Referências bibliográficas Artigo: O poder do brincar: um papel pediátrico na melhoria do desenvolvimento em crianças pequenas (Setembro de 2018) https://pediatrics.aappublications.org/content/142/3/e20182058 Acessado em 25/06/2020 Semana do Brincar – 41 Razões para o seu filho se divertir muito (Matéria de 31 de maio de 2019) https://revistacrescer.globo.com/noticia/2019/05/semana-do-brincar-41-razoes-para-o-seu-filho-se-divertir-muito.html Acessado em 05/06/2020 Inventar brincadeiras com crianças é saída em isolamento por coronavírus (Matéria de 18 de março de 2020) https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2020/03/inventar-brincadeiras-com-criancas-e-remedio-em-isolamento-por-coronavirus.shtml Acessado em 18/03/2020 Artigo 31 da Convenção dos Direitos da Criança: O desenvolvimento infantil e o direito de brincar. https://7fc4ffee-1c11-43f3-8e6b-7da2d2cfe9f6.filesusr.com/ugd/fb1026_ae832086bbd64020b941d0086c493012.pdf Acessado em 10/06/2020 Marco Legal da Primeira Infância https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/impacto/marco-legal/ Acessado em 05/06/2020 A descoberta do brincar. Dodje, Janine; Carneiro, Maria Angela. http://midiaomo.fbiz.com.br/locales/pt-BR/download/a-descoberta-do-brincar-livro2008.pdf

  • O brincar e as diferentes classes sociais

    - Denise Cristina Lins - O presente estudo objetivou mostrar a importância e o direito ao brincar a todas crianças, independente da sua localização e da classe social. A Declaração dos Direitos da Criança (1959) e a Convenção dos Direitos da Criança (1989), reconhecem que todas as crianças têm o direito ao descanso, lazer, brincar, às atividades recreativas, livres e à plena participação na vida cultural e artística. Hoje grande parte das crianças habitam nas grandes metrópoles e os espaços e territórios para o brincar são cada vez mais escassos. Quando pensamos na sociedade capitalista em que vivemos e na sua estratificação por classes sociais, a possibilidade de brincar fica mais comprometida para crianças pobres e ricas. Para a criança pobre há falta de equipamentos públicos, espaços para o brincar e, algumas vezes, a imposição do trabalho infantil. Para as crianças das classes mais altas, existe uma agenda de compromissos e cursos com o olhar para o futuro adulto. A existência de múltiplas infâncias e dos diferentes modos de ser criança é importante garantirmos o direito a todos de brincar. A maioria das crianças vivem nas cidades (UNICEF, 2012), a busca por uma vida melhor, com mais oportunidades e melhores condições de vida, faz com que grande parte da população procure viver nos grandes centros urbanos. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNDA) a maior parte da população brasileira 84,72% vive em áreas urbanas. Já 15,28% dos brasileiros vive em áreas rurais (2017). Em São Paulo o fenômeno da urbanização começou a partir de 1930, com o crescimento da industrialização. Segundo Sposito (2001), as correntes migratórias e o crescimento rápido da população converteram a cidade de São Paulo, em poucos anos, em local de habitação com carências urbanas. Este crescimento não estava atrelado à criação de uma infraestrutura. O Poder Público não se importou em oferecer serviços e espaços coletivos essenciais. Assim, as precárias condições de existência em centros urbanos, como São Paulo, interferiram negativamente na qualidade de vida de seus habitantes. O resultado do grande contingente de pessoas ocupando uma determinada região é: grande índice de desemprego, condições de vida precária e insalubre. Como podemos perceber, o crescimento urbano não está atrelado à igualdade de condições para todos. Ao contrário, ele escancara a desigualdade social, mostrando a cidade estratificada socialmente: de um lado espaços coletivos planejados, áreas de lazer e equipamentos, segurança e condições que garantem o acesso das pessoas; e do outro lado, nas grandes periferias, ausência de áreas de lazer e entretenimento e equipamentos degradados, sem condições de uso. As dificuldades e barreiras impostas aos menos privilegiados para que tenham garantido o direito ao acesso à cidade e que possam gozar das condições de vida urbana são peças importantes que caracterizam “ as restrições que atualmente se colocam nas cidades de concretização de direitos sociais das crianças.” Sarmento (2018) A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil. Lei nº 9.394/96), baseada na Constituição de 1988, mostra a importância do acesso da criança desde o nascimento até os seis anos, à educação infantil em creches e pré-escolas, compreendendo esta fase como a primeira etapa da educação Básica, responsável pelo desenvolvimento integral da criança nos seus aspectos físicos, psicológicos e sociais . As creches e pré-escolas em São Paulo são denominadas: CEI (Centro de Educação Infantil ) e EMEI (Escolas Municipais de Educação Infantil), sendo espaços específicos para o brincar e proporcionam que este aconteça de forma segura às crianças . Para um bebê ou uma criança, ingressar numa escola de Educação Infantil significa aprender a conviver na esfera pública, reunir-se com outras crianças e adultos, participar de distintos universos materiais e simbólicos e compartilhar diversidades. Segundo a Declaração Universal dos Direitos das Crianças, (1959) a criança é “sujeito de direito”, entre eles: alimentação, moradia, assistência médica, educação gratuita, lazer e proteção contra o abandono e exploração no trabalho, sem distinção. Além desses espaços institucionais, a criança necessita de outros espaços. O espaço local, a comunidade e o bairro são elementos iniciais de vínculo dos seres humanos ou das comunidades. (Currículo da Cidade- Educação Infantil, 2018) Cidades como São Paulo e outras grandes capitais, abrigam vários territórios Referências Sarmento, M. J. Infância e cidade: restrições e possibilidades. Educação, 41(2), 232-240. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2018.2.31317, 2018. SPOSITO, Marilia Pontes. Um breve balanço da pesquisa sobre violência escolar no Brasil. Educ Pesq [online], vol.27, n.1, pp.87-10

  • As mães como mediadores no brincar

    - Mariana Santana de Sousa Santos Curvelo - O brincar, ah o brincar é fascinante, o brincar é o momento de liberdade e de rico aprendizado! É durante o momento da brincadeira que a criança (adquiri) adquire confiança em si mesmo mesma, auto estima, entre muitos outros benefícios. Nos leva a lugares inimagináveis, proporciona vivências maravilhosas, pois durante um momento de brincadeira a criança pode ser o que desejar: fada, príncipe, princesa, sapo ,herói e até um abacaxi, se quiser. Para a criança, "O brincar é a atividade principal do dia-a-dia" (KISHIMOTO, 2010 p.1) Porém, como diz Sigmund Freud ¨ ao crescer as pessoas param de brincar e parecem renunciar ao prazer que obtinham do brincar¨ (Freud,1976,pg151), e assim se tornam saudosistas daqueles momentos de diversão. Por muitas vezes, acreditam que o brincar não faz mais parte de sua vida; e que brincar é coisa de criança . Mas, ao se tornarem adultos e se tornarem pais, a brincadeira volta a fazer parte de sua rotina, de seu dia a dia. Seus filhos necessitam de sua presença durante esses momentos e através desses momentos juntos eles criam um vínculo maior e mais significativo de confiança e de segurança. Nota-se a partir disto a importância das mães como mediadores do brincar. A importância das mães como mediadoras no brincar Os benefícios do brincar para o desenvolvimento da criança são muitos. O brincar ajuda no raciocínio ,na memória, no convívio social, na imaginação, na linguagem, fortalece a autoestima e auxilia tanto na saúde física como mental .São muitos os benefícios que o brincar proporciona na vida do ser humano e, quando se trata do brincar entre pais e filhos, eles se tornam ainda mais significativos, pois ¨ao estimular as crianças durante a brincadeira os pais tornam-se mediadores do processo de construção e conhecimento¨(CARNEIRO,eDODGE,2008,p80). Essa mediação se torna fundamental para a formação de vínculos afetivos, tornando essa relação efetivamente mais acolhedora, estreitando esse vínculo entre pais e filhos. Assim a criança se sente mais segura, confiante e feliz. ¨Ao ajudar a estabelecer relações de confiança entre pais e filhos, o brincar contribui para promover o equilíbrio físico e emocional¨(CARNEIRO ,e DOUGE,2008 p81). Mas sabemos que diante da vida corrida e agitada de muitos pais, nem sempre esses momentos são comuns e recorrentes, mas ante a tantos benefícios desse vinculo criado através do brincar, a conscientização sobre essa mediação se faz necessária. Afinal o brincar contribui para um desenvolvimento saudável e a criança que brinca com seus pais se torna mais segura e resiliente. Durante a pesquisa para o livro “A Descoberta do brincar” os entrevistados relatavam dificuldades para ter esse tempo livre para serem mediadores em brincadeiras com seus filhos, o que é comum se ouvir nos dias de hoje, onde a vida cotidiana exige que pais e filhos fiquem distantes por muitas horas, durante o dia, devido a seus trabalhos, dificultando incluir esse tempo em suas rotinas. Sendo assim, outras pessoas como educadores e cuidadores acabam exercendo essa mediação do brincar. Para as autoras desse livro mesmo que educadores ou terceiros cumpram, até certo ponto, essa função ¨é fundamental encontrar formas de ajudar os pais a inserir o brincar nas rotinas cotidianas com seus filhos¨ (CARNEIRO,eDODGE,2008,p83) . Para finalizar, ainda que há grandes passos a serem dados nesta questão, faz-se fundamental encontrar maneiras para que pais possam encontrar espaços em suas rotinas para esses momentos tão fundamentais para o desenvolvimento de seus filhos. Conclusão Através dessa breve e bem sucinta discussão sobre a importância dos pais como mediadores no brincar, conclui-se que, embora a criança brinque sozinha, ou mesmo se socialize com outras crianças, ou seja mediada por professores durante brincadeiras, a participação dos pais no brincar, agindo como mediadores, faz-se extremamente necessária, pois fortalece o vínculo afetivo, tornando seus filhos crianças mais resilientes, confiantes, seguras e contribui assim para um desenvolvimento saudável tanto físico como mental de seus filhos.

  • BRINCAR LIVRE É ILUSÃO ?

    - Luana Costa Ferro - Este trabalho apresenta alguns pontos que devemos esclarecer sobre a importância, em termos de experiências de vida, que o brincar livre pode proporcionar na construção de bases sólidas para a vida adulta e as diversidades que ela carrega. Tentar acabar com a falsa ilusão de que diminuindo os espaços, ou aumentando o acesso às tecnologias, suprimos a real necessidade do brincar livre. A esperança é esclarecer a sociedade como um todo sobre a realidade envolvida no simples ato de brincar livre, que leva a conhecer o mundo. Partindo dessa linha de pensamento, Manoel de Barros nos leva a pensar de forma simples e bela através do trecho do seu poema “Uma didática da invenção”. Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber: a) Que o esplendor da manhã não se abre com faca b) O modo como as violetas preparam o dia para morrer c) Por que é que as borboletas de tarjas vermelhas têm devoção por túmulos d) Se o homem que toca de tarde sua existência num fagote, tem salvação e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega mais ternura que um rio que flui entre dois lagartos f) Como pegar na voz de um peixe g) Qual o lado da noite que umedece primeiro Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios. (BARROS, 1993) O autor representa com toda leveza da poesia, a forma que o meio no qual estamos inseridos, junto com nossas interações, podem nos proporcionar momentos de aprendizagens significativas, momentos de invenções e significados para tudo com o que interagimos, que provavelmente só encontraremos em poucas instituições escolares. O contato com o meio ajuda de forma significativa nas diversas formas de aprender para a vida; e contribui no processo de novas aquisições no meio escolar, pois a bagagem vivenciada está diretamente ligada para novas aprendizagens. Partindo dessa forma de pensar, o que fica em aberto é em qual momento perdemos a nossa “liberdade? ” A liberdade de circular e brincar sem medo do que possa acontecer. Quando de fato criamos nossas fortalezas particulares de alta proteção quanto a tudo? E esquecemos ou simplesmente colocamos de lado o que realmente nos faz bem. Para qualquer criança suas vivências e memórias serão a base de construção para vida adulta. O que podemos esperar dessa geração tecnológica? Da lei do mínimo esforço, que podemos dizer que quase nada vivenciaram de fato. Qual será resultado de uma infância sem desafios e vivências não reais? Nesse contexto o professor Francesco Tonucci, cita as bases para a vida adulta. “Ao longo da vida, todo o cimento sobre o qual se constroem nossa formação e nossa cultura, foi adquirido nos primeiros anos de vida brincando. Além disso, brincar é a experiência que mais se parece à investigação científica e à experiência artística. ” (TONUCCI ,2016) Quando pensamos no brincar livre, logo nos vem à lembrança do estar “solto”. Criar coisas incríveis com coisas simples; a terra virava logo comidinha (s/vírgula) e mil receitas eram criadas com a ajuda das pedrinhas do chão. A rua sempre acabava sendo lugar de reunir a turma, local onde podíamos brincar livremente. Com o decorrer dos anos acabamos nos deparando com uma nova realidade, seja ela criada ou imposta. Quando pensamos no processo de evolução das cidades e o que a população necessita ou “acha” que necessita. Analisando os padrões familiares atuais, acabamos encontrando cada vez mais pais que trabalham muito; com a ideia de proporcionar o melhor para seus filhos, mas isso acaba surtindo efeito contrário. Os pais trabalham para dar tudo que julgam melhor para seus filhos, melhor colégio em tempo integral, aulas extras, etc. Mas quando, de fato, essas crianças estão livres (s/vírgula) para explorar sem preocupação ou criar a partir do natural? Essa resposta fica cada vez mais distante quando olhamos o meio que acabamos por construir para essas crianças. Cidades com mais e mais prédios, condomínios que proporcionam tudo sem precisar sair de “casa”. Tudo parece minimamente pensado e calculado, com espaços de lazer com muitos brinquedos e tecnologias. Mas isso realmente é proporcionar o necessário para uma criança? Onde estão o brincar livre, o desafio, as descobertas e as vivências do real? Nesse ponto Tim Gill apresenta uma visão clara e objetiva sobre esse tema: “Se quisermos que as crianças sintam que são parte de uma comunidade, que pertencem à cidade”, prossegue Gill, “que têm direito à cidade, responsabilidade e conexões com outras pessoas, se quisermos que se sintam cidadãos engajadas, nós temos que garantir a oportunidade para elas sentirem essas conexões”. (GILL, 2016) Precisamos de fato evoluir o pensamento quando tratamos de educação, não no sentido tecnológico, mas no sentido de seres humanos que estamos dispostos a formar para vida. Considerações finais O mundo segue em passos largos os avanços tecnológicos e assim, por consequência, todos os setores das nossas vidas são atingidos. Acredito que tudo serve para somar no dia a dia, e assim não seria diferente na vida e na escola; devemos apenas medir as consequências de uma total substituição. Quando falamos de crianças, sabemos que a forma pela qual elas mais aprendem é com o meio e pelo contato com o outro. Acredito que devemos criar pontes que façam essas ligações tecnológicas e o brincar livre no meio; e não levantarmos muros que isolam somente um pensamento. O olhar sobre o brincar livre vai além do próprio meio familiar, acaba por se estender para as esferas governamentais, onde é urgente pensar políticas públicas que de fato garantam o brincar livre, como de fato deve ocorrer em sua real essência. Devemos estabelecer, não somente no papel, um ensino adequado e realmente voltado para a educação infantil, pois ainda caminhamos em pequenos passos, projetando tão cedo responsabilidades que acredito não serem nem do ensino fundamental. Devemos ter um olhar mais responsável com o futuro das crianças. Referências bibliográficas: TONUCCI, Francesco. A criança como paradigma de uma cidade para todos. Educação e território, 2016. Disponível em: https://educacaoeterritorio.org.br/reportagens/francesco-tonucci-a-crianca-como-paradigma-de-uma-cidade-para-todos/. Acesso em: 06 maio. 2020 às 18 h 40 min. GILL, Tim. Crianças no espaço público são grandes ativadores de comunidades. Educação e território, 2016. Disponível em: https://educacaoeterritorio.org.br/reportagens/tim-gill-criancas-no-espaco-publico-sao-grandes-ativadores-de-comunidades/. Acesso em: 06 maio. 2020 ás 18 h 17 min. BARROS, Manoel. Uma didática da invenção – Maior que infinito é a encomenda. Xapuri Socioambiental, 2017. Disponível em: https://www.xapuri.info/cultura/literatura/barros-didatica-da-invencao/. Acesso em: 09 maio. 2020 às 17 h 07 min.

  • BRINCAR E AS DANÇAS POPULARES socialização e saúde dos idosos

    - Aline Lima - “Cirandeira, cirandeira Venha pra cá Venha formar a roda, cirandeira Vamos todos cirandar Oh cirandeira!” Desde 2007 proponho atividades que permeiam o universo da cultura popular brasileira. Tive uma infância de muita brincadeira, conheci mestres e mestras populares que me deram a oportunidade de aprender, e acender a chama desses saberes em mim. A primeira vez que dancei uma ciranda foi na praia da Ilha do Mel, momento histórico, depois daquela viagem a ciranda permaneceu presente na minha vida, tamanho foi o impacto! Junto com ela veio o gosto e a vontade de estar em grupos, de cantar, improvisar, tocar, compartilhar experiências e vivenciar a alegria da arte do encontro que senti naquela ciranda. Em 2009 comecei um trabalho com idosos na periferia de São Paulo, e para o meu encantamento esse público enriqueceu a minha percepção de como fazer, de como propor as atividades. Eles já sabem muito! Então, trazer o que eles sabiam, foi o caminho. Logo foram aparecendo letras de músicas, versos, poesias, entusiasmos, animação, e muita contribuição que potencializou o trabalho. Entre 2018 e 2019 percorri vários núcleos de convivência de idosos na Capital de São Paulo, através do projeto Guardiões do Brincar, da IPA Brasil. Em sua maioria a receptividade dos idosos para com as brincadeiras, músicas e danças populares foram muito parecidas com as que eu já conhecia: lembrança da infância, versos que estavam na memória, contos e histórias vivenciadas ou inventadas na juventude, e das festas populares. Os idosos permitiram-se brincar, experienciar os jogos corporais dançantes aliados aos ritmos brasileiros (forró, coco de roda, e cirandas), exercitando o corpo e a mente, em um processo espontâneo (brincando), descobrindo potencialidades adormecidas, interagindo com o outro e contribuindo com o andamento do grupo, socializando-se. As danças e músicas brasileiras têm seus princípios nos rituais de celebrações dos povos antigos (época da colheita, de funeral, recreação, ou adoração aos deuses); é hoje o que ficou de mais presente das festas populares tradicionais (Bumba meu boi, Carnaval, Festas Juninas…), que ainda acontecem em algumas regiões do Brasil (Matos, 2006). Tais movimentos e ritmos inspiraram as brincadeiras cantadas e dançadas (cirandas), realizadas pelas crianças, com letras que remetem a sistemas de trabalhos, e de necessidades básicas da vida humana. É importante lembrar que o brincar para os idosos é diferente do brincar para as crianças, para estas situam-se em fase de descobrir o mundo, enquanto os mais velhos estão revendo, ressignificando, portanto, não devem conter caráter infantilizado, respeitando seu papel social (Matos, 2006). “Meu limão, meu limoeiro Meu pé de Jacarandá Uma vez tindo lele Outra vez, tindo lala” A importância do convívio social na terceira idade minimiza os efeitos negativos do envelhecimento, pois estimula as atividades físicas e cognitivas, além de satisfazer uma necessidade imaterial, mas de prazer e afetividade (Matos, 2006). Os médicos já as recomendam há algum tempo, como mostra o projeto Arts on Prescription, iniciado em 1995 no Reino Unido, onde os idosos eram encaminhados para uma série de atividades em grupo, como complemento dos tratamentos convencionais (Poulos et.al., 2018). Dançar está entre os processos classificados como bem sucedido, para o envelhecimento saudável (Maia et. al. 2020). Além de proporcionar movimento ao corpo, cuida da mente promovendo bem estar. Garantir o direito de uma boa velhice está na Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), sabendo que a população idosa tende a aumentar no Brasil segundo o IBGE, de 43,19%, em 2018, para 173,47%, em 2060, mostra-se de suma importância ações que apontam o caminho para o envelhecimento saudável. E em tempos de pandemia por Covid-19, o que fazer? REFERENCIAS MAIA, Luciana Colares et al. Idosos robustos na atenção primária: fatores associados ao envelhecimento bem sucedido. Revista de saúde pública (online), São Paulo, v. 54, 35, 2020. MATOS, N.M. O significado do lúdico para idosos. 2006. 169f. Trabalho de pósgraduação (gerontologia). Universidade Católica de Brasilia. Brasília. 2006. POULOS, R.G. et. al. Arts on prescription for community‐dwelling older people with a range of health and wellness needs. Revista Wiley Health and Social Care. Austrália. p.1-10. 2018.

  • O que se pode aprender ao pé de uma grande árvore? Contação de Histórias para crianças em Perus

    - Vanessa Correia Gonçalves - *Fotos de Letícia Santana. Maio e junho de 2019 Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele contexto se encarnavam também no assovio do vento, nas nuvens do céu, nas suas cores, nos seus movimentos [...]. Paulo Freire Foi pensando nessas perguntas e no desejo de refletir sobre arte e primeira infância que a autora dessas breves linhas criou uma proposta artística e brincante de contação de histórias para, e um pouco com, crianças pequenas ao pé de uma grande árvore no bairro de Perus, mais especificamente, no jardim da Biblioteca Municipal Padre José de Anchieta, em 2019. A ideia nasce dentro um projeto cheio de propostas e atividades elaboradas pelas Jovens Monitoras Culturais , Letícia Santana e Vanessa Gonçalves (criadora da proposta e autora do presente texto), juntamente com a Coordenadora da biblioteca, Elizabeth Pedrosa. Nesse projeto, entre muitos desafios, estava o desejo de refletir e criar programações artísticas e culturais que dialogassem com diversas linguagens, destinadas a públicos e frequentadores com faixas etárias diversas e que ainda(s/vírgula) contribuísse nos diálogos, parcerias e aproximações que já existiam entre biblioteca, território e seus moradores. Ao abrir espaço para que tais projetos e iniciativas ocupem a biblioteca, este equipamento público firma seu compromisso social e político(s/vírgula) e oportuniza um espaço muito importante para formação e aprimoramento cultural das agentes propositoras. O presente artigo busca trazer à tona o processo de criação dessa prática de contar história para crianças pequenas e relatar a experiência, de um dos dias, em que essa proposta foi colocada em prática com crianças e educadoras de um Centro de Educação Infantil vizinho à biblioteca, em Perus. Reflexões e relatos acerca da experiência de Contação de Histórias para crianças pequenas Além das perguntas relatadas no início do texto, os pontapés iniciais, basearam-se em alguns pressupostos e eixos de exploração que guiaram a construção da contação de história e sua realização; são eles: a intervenção e ressignificação do espaço; a exploração de elementos naturais locais; a construção de narrativas orais, sonoras e corporais; e, por fim, a experimentação de uma proposta formada por diversas linguagens. Os primeiros pressupostos que conectam os eixos centrais de elaboração e concretização dessa contação de história no projeto, dentro da biblioteca, estão no reconhecimento, primeiramente, da criança de pouca idade como possível espectador e crer que ações culturais/ artísticas/ lúdicas contextualizadas podem ser experienciadas por elas é partilhar do entendimento de que esses sujeitos possuem, desde os primeiros anos de vida, capacidades e habilidades para ler e interpretar o mundo segundo os seus próprios parâmetros. (ROSA, p. 202, 2016). E por essa razão, reconhece-se também quão necessária é a proposição de experiências estéticas e culturais para a primeira infância que dialoguem com suas especificidades e formas de enxergar e elaborar o mundo, dentro de equipamentos culturais, como uma forma de garantia ao direito dessas crianças à fruição estética, apreciação e participação na produção de bens culturais. O segundo aspecto, está ligado à concepção de que a criança pequena é movida por uma percepção multissensorial, em que todo o seu corpo está engajado na sua interação com o outro, com o que está à sua volta e na forma como articula os saberes e as experiências adquiridas e construídas, fazendo com que, por meio da estruturação de múltiplas linguagens, elas possam ampliar “o repertório que servirá de base as suas criações” (LEITE, p. 97, 2015). Partindo desses dois pressupostos fundamentais, o próximo passo, foi construir uma narrativa, recortando e colando histórias que ouvi com aquilo que, naquele momento, mais me despertava vontades e sensações. Me recordei dos contos de origem, daqueles contos em que um pouco de terra e água dão origem a tudo que hoje existe. Além da palavra oralizada, fui lembrando e elaborando uma série de músicas, sons, imagens e movimentações corporais que não poderiam deixar de configurar essa narrativa. Separei um agogô feito de coco, um chocalho com grãos, duas partes de um coco, um ocean drum improvisado e alguns apitos com sons diversos. Experimentei algumas músicas cantadas com as palavras e, aos poucos, a narrativa oral, a narrativa sonora e a narrativa visual concretizavam o que seria a Contação, mas ainda faltava algo. No segundo momento, ao refletir sobre as formas e meios de percepção e conexão com aquilo que nos cerca, percebi que aqueles elementos fundantes, que estavam na origem da narrativa, a água e a terra, não tinham ainda adentrado na construção. E como falar desses elementos tão concretos e reais, sem ao menos ter a oportunidade de tocá-los? Foi então que passei a coletar uma série de materiais naturais para compor a narrativa de modo que, além de oral, sonora, visual e corporal, ela seria vivenciada também pelo toque, pela relação da nossa pele com esses materiais. Depois, busquei dentro da biblioteca um espaço onde a proposta poderia ser realizada. Refleti sobre como aqueles espaços, antes marcados pelo silêncio, hoje são constantemente ressignificados com a presença de apresentações artísticas, oficinas, ocupações dos coletivos do território, rodas de conversas etc., e que essa seria mais uma oportunidade de intervenção no espaço externo da biblioteca, no seu jardim, mais especificamente. Além de ser um espaço de passagem, de descanso e de compartilhamento cultural, essa área abriga árvores muito antigas e que, volta e meia, são referenciadas nos relatos e memórias de antigos frequentadores. Por isso, a Contação de História aconteceu embaixo de uma das árvores mais antigas do jardim. Construída a narrativa, coletados os materiais e escolhido o espaço, por fim, convidamos os CEIs vizinhos à biblioteca para que trouxessem suas turmas, em dias e horários combinados, para participarem da proposta. É importante relatar que tais CEIs já possuem uma relação e parceria muito estreita com a biblioteca, participando de diversas programações durante todo o ano e utilizando os espaços e acervos da biblioteca onde realizam suas propostas pedagógicas com as turmas. Em um dos dias combinado, recebi as crianças no jardim em silêncio. Atentas, elas observaram tudo que estava à minha volta, também as observei, essa turma tinha entre 3 e 5 anos. Respirei fundo e iniciei a Contação da História, tocando o agogô feito de coco. A participação delas e deles foi imediata. Conforme a narrativa ia se apresentando, eu ia convidando as crianças a participarem e se relacionarem com aquele acontecimento artístico, seja pelo toque, pela escuta, pelo olhar, ou mesmo pelo corpo todo, quando levantávamos para ver o ponto mais alto da árvore que estava a nossa volta, ou para pegar os barquinhos feitos de papel que iam navegar por um rio, que nós compartilhávamos dentro da nossa história. Quase no final da narrativa, eu coloquei entre mim e elas um punhado de argila, a “nossa matéria para a criação”, e fiz um convite para criarmos uma parte desse mundo. Rapidamente, algumas foram pegando seus punhados, outras estranharam a textura e resistiram, até que decidiram por si mesmas experimentar. Sem nenhuma indicação, algumas pegaram elementos do jardim, folhas e gravetos que caiam da árvore, também terra e água que já haviam sido experimentados pelas crianças durante a narrativa. Nesse tempo, eu assumi uma postura de observadora e boa parte delas continuaram a narrativa, nomeando, misturando e conversando entre elas, comigo e com as educadoras que acompanhavam. Passado um tempo, encerrei com algumas frases e me despedi da turma, mas não daquela experiência. O que se pode aprender ao pé de uma grande árvore? Ao realizar algumas vezes essa proposta, notei que nela também havia uma natureza brincante, seja porque vários elementos se tornam, durante a contação, materiais de brincar, seja porque, ao final, as crianças de fato brincam com aquilo que foi apresentado e disponibilizado. E ao observá-las, constatei que em boa parte das vezes, aquelas crianças estavam elaborando uma leitura própria daquela vivência compartilhada, a partir do vivido, mas também a partir de seus próprios referenciais culturais e sociais, à medida que iam trazendo à tona, no decorrer, comparações, diferenciações e relatos diversos. Passado um tempo, percebo o quanto para mim, agente propositora, essa experiência foi significativa, divertida e trouxe diversas reflexões. Percebi que ainda tenho muito o que aprender sobre as crianças pequenas e compreendi que esse foi apenas um pontapé inicial para uma elaboração que poderá ser mais aprofundada, com mais histórias e contos elaborados, especialmente para esse tipo de proposta, com uma pesquisa mais minuciosa em cada um dos eixos citados, na busca de materiais diversos que poderão ser utilizados e sobre, propriamente, as particularidades de interlocução com as crianças pequenas. Essas e outras noções, adquiridas na experiência, também tiveram a oportunidade de serem revisitadas e refletidas a partir dos aportes teóricos disponibilizados e aprendidos durante a formação em Agentes do Brincar®. Vivenciar essa formação hoje possibilita que, em um amanhã próximo, essa proposta seja modificada, aprimorada, mais bem planejada e que sua realização seja possível em outros contextos, pois as trocas e os aprendizados experienciado durante o curso, com formadores com trajetórias diversas e com o coletivo de Agentes do Brincar® que estamos formando, têm sido importantes alicerces para práticas e realizações futuras. Gostaria ainda de, para encerrar, evidenciar a importância e necessidade que espaços e produtores/as culturais reconheçam as crianças da primeira infância como públicos da cultura e, dessa forma, incentivem produções artísticas, nas mais diversas linguagens e, especialmente, pensadas para essa faixa etária, além de possibilitar espaços para que as crianças possam, como protagonistas e fazedoras de cultura, participar de processos criativos e inventivos sobre a realidade cultural da cidade. Referências Bibliográficas FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se complementam. São Paulo: Cortez, 2011. LEITE, Maria Isabel. Arte e expressão. In: PARK, Margareth Brandini; FERNANDES, Renata Sieiro (org.). Programa Curumim: memórias, cotidiano e representações. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015. p. 95-110. NALINI, Denise (coord.). Conexões: a poética das crianças de 0 a 3 anos e a arte contemporânea. São Paulo: Instituto Avisa Lá, 2015. Disponível em: https://avisala.org.br/wp-content/uploads/2017/09/Livro-Conex%C3%B5es_Livro.pdf. Acesso em: mai. 2020. RIBEIRO. Kelly Cristine. Contação de histórias: seguindo o curso de suas águas. 2013. 197f. Dissertação de mestrado – Universidade Estadual da Bahia. Faculdade de Educação, Salvador, 2013. ROSA, Lucelina Rosseti. Cultura e primeira infância: perspectivas para as crianças de pouca idade. Revista do Centro de Pesquisa e Formação do SESC, São Paulo, n. 03, p. 186-206, nov. 2016. Disponível em: https://www.sescsp.org.br/files/artigo/11949853-4c6c-4059-a05e5626f8e1a4e4.pdf. Acesso em: mai. 2020. Secretaria Municipal de Cultura. Programa Jovem Monitor Cultural 2020 abre inscrições. Supervisão de Formação Cultural. 2020. Disponível em: http://supervisaodeformacao.prefeitura.sp.gov.br/index.php/editais-formacao-smc-pjmc-2020/. Acesso em: 20 de mar. de 2020. Anexo: Retratos da experiência de Contação de Histórias para crianças pequenas em Perus.

  • Brincar e educar juntos. Por que não?

    - Leila Lopes - Este artigo tem como objetivo refletir sobre a importância do brincar na educação, determinando uma relação do lúdico com o desenvolvimento da pessoa. Considero que a brincadeira é uma linguagem infantil que mantém um vínculo essencial, que associa a imitação do mundo real e o que a criança imagina. Quando brincam, os sinais, os gestos, os objetos e os espaços contribuem e significam outra coisa para as crianças. Diferente da forma em que nós, adultos, enxergamos. Ao brincar as crianças recriam e refletem os acontecimentos vivenciados por elas. As brincadeiras e o brincar livre ajudam a autoestima, contribuindo na formação de sua personalidade e suas aprendizagens, quando brincam de forma criativa, transformando seus conhecimentos prévios em conceitos gerais com os quais brincam e aprendem. O brincar para as crianças é a construção de conhecimento de tudo que está em sua volta, é a construção do mundo. Acredito que através do brincar a criança desenvolve a linguagem, o pensamento, a socialização, a iniciativa, a empatia, preparando-se para ser um cidadão capaz de enfrentar seus desafios, medos, ansiedades e participar na construção do meio onde vive, da sociedade como um todo. O brincar na educação ajuda as crianças a construir o conhecimento, podendo ser entendido, como situações em que as crianças possam expressar diferentes sentimentos, tornando-se capaz, assim, de aceitar a existência do outro. Dessa forma elas fazem parte do contexto onde vivem, estudam. Mas, às vezes reflito, até onde o brincar é livre, já que nas instituições escolares, tudo é cronometrado, tudo tem o seu tempo:15 minutos para o lanche, 20 minutos para brincar no parque, no tanque de areia. Mas só para pensar na brincadeira as crianças levam esses 20 minutos! Esse brincar livre, para as crianças deve ser visto pelas escolas como um modo de construção de saberes e vivências da sociedade. O brincar pelas crianças deve ser visto, como elas lidam com a convivência, divisão, solidariedade e como elas conseguirão, quando adultas, enfrentar suas frustrações, desilusões, perdas. No 1º momento deve ser um brincar intencional, sem intervenção (acompanhar, observar, registrar) e sem a questão do controle. Acho que o tempo de brincar para as crianças deve ser livre, para que haja o estímulo e criação de brinquedos e brincadeiras, assim desenvolvendo a imaginação e a interação com as outras crianças, bem como o saberes e construções que são estimulados com o brincar. Segundo Francesco Tonucci: “Os deveres não contribuem em nada com a formação das crianças, atrapalham muito e impedem o brincar. Ao contrário, a escola deveria ser uma das mais interessadas no livre brincar das crianças, porque é assim que elas vivem experiências e emoções que amanhã poderão ser aportes à vida escolar. As boas escolas que eu conheci não enfocavam nos programas ministeriais ou nos livros, mas sim na experiência de vida dos alunos.” Já para Friedrich Froebel (criador do Jardim de Infância) “O brincar é uma das principais formas de aprender, ensinar e apresentar o mundo. O brincar é a base do aprendizado da criança. Brincar é a fase mais importante da infância, do desenvolvimento humano, neste período por ser a auto ativa representação do exterior a representação de necessidades e impulsos internos. Brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação. Nas brincadeiras, a criança tenta compreender seu mundo ao reproduzir situações da vida.” Infelizmente observo que as escolas só querem passar conteúdos, não levando em consideração as potencialidades de cada criança e o brincar, as brincadeiras favorecem essas descobertas: a criatividade, os sentimentos, o convívio com o outro, com o mundo. Brincar não é algo sem razão, sem propósito, brincar sempre tem uma intenção. Quando observo crianças brincando percebo como são ricos os conhecimentos que nos fazem refletir sobre as relações do cotidiano das pessoas. Pois as crianças brincando imitam suas vivencias diárias. Suas relações com os pais, amigos, professores. Entendo que as atividades lúdicas melhoraram a socialização entre as crianças, fazendo com que vivenciem situações de colaboração, trabalho em equipe e respeito, empatia. Enquanto brinca, a criança está pensando, criando e desenvolvendo o pensamento crítico sobre o mundo. Mas penso, que é preciso mudar o cenário das escolas, investir na formação dos professores, gestores escolares para que assim, eles respeitem a essência do brincar: e nisto o professor deve se tornar o personagem principal dessa mudança. E isso não é na faculdade de Pedagogia que se aprende. O professor precisa ter uma formação e capacitação para entender como o brincar é essencial na vida das crianças; entender que o brincar é, de fato, uma contribuição na construção de futuros cidadãos bem resolvidos, criativos, ousados e preparados para enfrentar a realidade do contexto onde estão inseridos, tornando-se participativos na sociedade. As brincadeiras são linguagens não verbais, com as quais as crianças expressam e passam mensagens, mostrando como elas interpretam e enxergam o mundo. E como elas vão se comportar quando adultas: alienadas ou equilibradas. O lúdico não é a única alternativa na formação do sujeito, mais é um auxiliar indispensável e importante nos resultados deste processo, porque o lúdico favorece à criança o equilíbrio entre o que é real e o que ela imagina; assim ela se desenvolve e adquire conhecimentos de uma forma agradável. Brincar (s/vírgula) deve fazer parte do cotidiano da criança dentro e fora da escola, porque brincar também é uma necessidade básica, assim como comer, a saúde, a habitação, a educação e ajuda a criança no seu desenvolvimento físico, afetivo, social. O brincar é uma linguagem natural da criança e é importante que esteja presente sempre na escola; brincar e estudar devem caminhar juntos, no propósito de contribuir para a formação das crianças como um todo. Concluo que hoje, como as crianças estão entrando nas escolas cada vez mais cedo, as instituições devem analisar se não estão queimando etapas fundamentais na formação destes futuros cidadãos, esquecendo que o brincar, as brincadeiras, enriquecem e fazem parte desta formação. Crianças podem e devem aprender brincando: cabe às escolas e principalmente aos professores proporcionar isso a elas. Bibliografia www.scielo.com.br https://educacaoeterritorio.org.br/reportagens/francesco-tonucci-a-crianca-como-paradigma-de-uma-cidade-para-todos/ www.novaescola.org.br › conteudo › friedrich-froebel-o-for...

  • TRAZENDO O LÚDICO PARA OS MUSEUS

    - Cecília Neves Kappler - Imagem: material expográfico desenvolvido por Pedro Federsoni e Silvana Calixto. (Foto Cecília Neves Kappler, 2019). Muitas pessoas têm certo preconceito quando se trata de museus, inclusive as crianças. Ainda hoje, o que mais vemos são aqueles formatos tradicionais de museu, pouco interativos e inclusivos. Trazer aquela temática exposta para uma linguagem mais “palatável”, lúdica e universal pode ser um desafio, mas há alternativas de abordagem e mediação. Apesar de ser uma pessoa que adora frequentar todo e qualquer tipo de museu desde criança, não posso dizer que minha experiência com esses passeios se deu de forma inovadora. Acredito que o fato de eu gostar de ir a exposições decorre do meu gosto pelas artes em geral e dos edifícios/espaços em que são expostas. Foi em 2019 que eu conheci uma nova maneira de se fazer museu, ao fazer o curso de Museologia e Museografia do Instituto Adolfo Lutz. Nesse curso, além de técnicas expositivas, nos foi apresentado o trabalho realizado pelos professores Pedro Federsoni e Silvana Calixto. Esses dois biólogos trabalharam nos museus do Instituto Butantã e do Instituto Biológico e, hoje, atuam no Museu do Instituto Adolfo Lutz. Apresentando um acervo incrível de materiais expositivos que contribuíam para aproximar o público, principalmente crianças, daquele conteúdo técnico e científico. Eles construíram modelos de feltro de parasitas, mosquitos feitos em papel marchê, células feitas de massinha entre outras soluções -, com peças didáticas, coloridas e, além disso, sensoriais. Baseando-se nos sentidos do tato (texturas) e da visão (cores) os museólogos puderam criar modelos explicativos que podiam ser “vistos” até por quem não pode enxergar e explorados de perto sem as limitações geralmente associadas aos museus. Aquele curso nos mostrou que é possível fazer museu brincando e possibilitando o brincar. No texto “Educação não formal: museu e a linguagem não verbal”, Pedro Federsoni discorre da importância dessa forma alternativa de educação, em algo por ele chamado de “edutenimento” (educação + entretenimento). O educador não formal pode ser o pai ou a mãe respondendo perguntas dos filhos, seu irmão mais velho, seu amigo, o monitor do museu, todos podemos sê-lo. Com muita observação do mundo ao nosso redor e das pessoas, se valendo de gestos e tendo “interesse em ensinar com muito entusiasmo”, é possível criar uma experiência museológica divertida, que através de brincadeiras, cores, texturas, sons e odores faça o visitante sair daquele local, que se propõe ensinar, com mais conhecimento do que entrou e fazendo mais relações com o mundo exterior. Cristina Carvalho e Thamiris Lopes (2016) tomam a infância como fase de descobertas e formação da identidade pessoal e social do ser humano. Sendo os museus um local privilegiado de educação não formal, onde conteúdos podem ser apresentados de maneira dinâmica e interativa, ações que vão além da simples contemplação dos objetos devem ser incentivadas. Emoção e imaginação podem ser ferramentas nessa aproximação das crianças com as artes, já que “a brincadeira é uma das formas utilizadas pelas crianças para compreender o mundo e produzir cultura”. Incentivando a mudança da mentalidade de que públicos infantis são ameaças à segurança do acervo. Carvalho e Lopes falam da importância de buscar alternativas que, ao invés de reforçar as regras de comportamento (não tocar, não comer, não correr etc.), tornem a experiência da visita mais prazerosa. Propor oficinas, explorar áreas externas e levar em consideração o protagonismo e especificidade das crianças, torna possível ressignificar a experiência museológica. O púbico infantil, que possui direito a frequentar esses espaços culturais, como qualquer cidadão. Além do olhar contemplativo, que é um importante exercício no momento das visitas, Carvalho e Lopes destacam que é possível agregar complementos como “o faz de conta, a imaginação, a contação de histórias e as brincadeiras”. Perguntar às crianças que nomes dariam àquele quadro, quanto tempo será que levou para aquela obra ser feita, se elas conseguem se imaginar dentro daquela cena, se conseguem imitar a pose de uma estátua, são questionamentos que podem ser feitos para dinamizar a contemplação de uma obra. As ações do mediador devem levar em conta a tríade museu-criança-brincadeira. Considerando minhas experiências mais marcantes ao visitar museus na infância, gostaria de destacar dois espaços: Museu Imperial de Petrópolis (RJ) e Estação Ciência (SP). O primeiro pelo próprio edifício e acervo da família imperial, mas principalmente pela experiência de usar pantufas durante a visita, o segundo pelas experiências científicas que mostravam na prática brincante alguns conceitos da física e química. No caso do Museu Imperial, a obrigatoriedade de calçar pantufas para a visitação dizia respeito à proteção do piso de madeira do edifício (segurança do acervo), mas acabou se tornando a parte mais marcante daquela visita, pela aparência engraçada ao usar pantufas sobre os próprios sapatos e possibilidade de sair “patinando” pelo museu. Uma ação de proteção do acervo acabou se tornando brincadeira. A questão da escala também pode gerar experiências sensoriais. Mirela Estelles (2015) descreve como o Jardim das Esculturas do MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo) instiga que o público, infantil ou adulto, explore as obras com seu próprio corpo. Ao se depararem com aquelas grandes esculturas, começam a “entrar, correr, andar, subir, encontrar, perder, girar, sair, tocar”. Ações muito diferentes das restrições de comportamento usualmente impostas nos espaços expositivos, e que acabam se mostrando muito divertidas para o público infantil que busca movimento, algo que vai ao encontro do que Carvalho e Lopes apontam ao comentar a importância do incentivo à interação e motricidade. Segundo Flores (2007), através das vivências como essa é que a criança aumenta seu repertório e elabora seus “entendimentos sobre e museu e suas funções”, podendo ir além de ideias pré-concebidas e simplórias como entender museus como algo desinteressante. O próprio Jardim das Esculturas nos faz inclusive repensar o conceito do que seria um museu, visto que as obras estão dispostas no Parque Ibirapuera. Considerando que o direito à cultura é “essencial ao homem em seu processo de humanização” (FLORES, 2007), e que “o brincar é uma parte vital e fundamental da experiência humana” (FLORES, HERRERO; 2018), podemos concluir que nada mais humano do que se brincar em um Museu, independente de idade. Referência Bibliográfica CARVALHO, Cristina; LOPES, Thamiris. O Público Infantil nos Museus. Educ. Real., Porto Alegre, v. 41, n. 3, p. 911-930, Set. 2016. Disponível em < http://dx.doi.org/10.1590/2175-623652329>. Acesso em 27 de maio de 2020. ESTELLES, Mirela. Corporeidade: a criança e a obra de arte. In. Obras Mediadas. CHAIMOVICH, F (Org.), Ministério da Cultura, Governo do Estado de São Paulo, Secretaria da Cultura e Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2015, p 65 - 75. ESTELLES, Mirella. Corpoereidade: a criança e a obra de arte. In. Obras Mediadas. CHAIMOVICH, F (Org.), Ministério da Cultura, Governo do Estado de São Paulo, Secretaria da Cultura e Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2015, p 65 - 75. FLORES, Celia L. B. O que as crianças falam sobre o museu. Dissertação de mestrado em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. FLORES, Marilena; HERRERO, Dafne. O brincar nos faz iguais e naturais. Senado Federal, 2018. Disponível em . Acesso em 29 de julho de 2020. JUNIOR, Pedro Antonio Federsoni. Educação não formal. Museu e a linguagem não verbal. Biológico, São Paulo, v.65, n.1/2, p.105-107, jan./dez., 2003. Disponível em . Acesso em 27 de maio de 2020.

  • Observar primeira infância e o poder do brincar

    - Bárbara Alves Garcia - É muito comum ver em escolas de educação infantil, principalmente com as idades de 4 e 5 anos a seguinte fala, “aqui as crianças só podem brincar em um determinado período da grade horária, temos um currículo a cumprir. No fundamental eles não podem brincar, precisam acostumar que a brincadeira é só em casa”. Mas sabemos que essa é uma atitude totalmente contraditória, já que dentro da Educação Infantil, deve-se garantir o direito do brincar. O educador tem um papel extremamente importante para esta garantia. A formação de um profissional qualificado e que entenda que o brincar não é apenas entretenimento, mas que o brincar promove ao desenvolvimento motor, de identidade e de competências que acontecem nessa interação, é necessário. Na Declaração Universal dos Direitos das Crianças, escrita pela ONU, no artigo 7, entre os direitos de que toda criança deve ter, está o direito de brincar. Na seguinte frase “Toda criança terá o direito de brincar e a divertir-se, cabendo à sociedade e às autoridades publicas garantir a ela o exercício pleno. “O universo infantil está presente em cada um de nós”. Ou seja, é dever de todos nós, cidadãos, garantir esse direito a todas as criança. A criança, sendo um ser de direito, precisa ser tratada de forma respeitosa. E não como alguém passivo que precisa apenas ir para a escola e aprender a se preparar para a vida adulta. Quando a brincadeira é barrada ou impedida, o desenvolvimento da criança está sendo prejudicado também. Por meio do brincar, a criança está desenvolvendo habilidades, criatividade, empatia. Sobre o papel do educador, quatro pontos são importantes para conseguir garantir e ter uma visão ampla sobre o brincar. A formação, saber inspirar os seus alunos, organizar o espaço, e conseguir observar esse brincar. A formação é o que consolida os outros três pontos, por isso vou falar dela no final. Dentro da escola, existe o brincar dirigido e o brincar livre. O educador consegue inspirar e realizar diversas interações entre os tipos de brincar. De acordo com o texto “Excelência do brincar”: O brincar dirigido, a criança pode explorar as possibilidades oferecidas dentro da ideia inicial do educador. O brincar dirigido pelas crianças, ou seja, o brincar livre, as crianças estabelecem entendimentos compartilhados com os adultos e estão usando o brincar para promover seus próprios objetivos. O brincar que é originado pelas crianças dentro da estrutura educacional da a eles liberdade e segurança para se expressarem imaginativamente. (Excelência do brincar - pagina 206) Com uma observação atenta e cuidadosa, conseguir perceber as relações entre as crianças no brincar, conseguir perceber também que o brincar promove o desenvolvimento infantil, mas que também melhora a capacidade emocional, intelectual, motora e social das crianças, é algo rico. Em relação à organização do espaço, pode parecer algo fútil e desnecessário. Mas ele é tão importante quanto conseguir observar as interações. O espaço convida a criança para brincar, o educador deve considerar objetos que possam estimular o desenvolvimento integral da criança. Os objetos devem ser pensados, de modo que possam ser desafiadores e, ao mesmo tempo, não tragam riscos para a criança. Com um olhar desse educador, ele consegue trazer brincadeiras que vão além da tradicional. Conhecendo os seus alunos, consegue propor atividades desafiadoras. Lembrar também que dentro do espaço, é necessário uma igualdade no brincar. E como essa igualdade aparece? Dentro das primeiras relações de brincar entre as crianças, os vínculos começam a ser formado. Junto com esses vínculos, as crianças trazem o seu próprio cultural de casa. Muitas vezes, as crianças vivem em uma “bolha”. Dentro da escola, a professora pode, consegue e deve apresentar as diferentes tipos de cultura dentro da brincadeira. Dentro de brincadeiras é possível, de um jeito educativo, muito além das famosas “feiras de ciência” trabalhar culturas poucos reconhecidas, a cultura que temos no nosso pais e que é muito atacada, a indígena, a culturas das crianças com deficiência, a comunidade LGBTQ, a diversidade de gênero, e culturas da periferia urbana. Importante dizer também, que a brincadeira vai muito além do jogo pedagógico, ou de bonecas e carrinho. A brincadeira se torna mais legal quando o jogo pode ser construído e jogado. Olhando para a nossa sociedade, o trabalho é a única preocupação que temos. Muitas pessoas trabalham todos os dias o dia inteiro, deixando o brincar na infância de lado. Mas se soubesse o poder que o brincar tem, ainda sim na vida adulta, com certeza iria trazer felicidade. Seja um jogo de tabuleiro, um jogo esportivo. É necessário que todas as pessoas considerem o brincar durante toda a vida, seja na infância, adolescência, na vida adulta e até a velhice. Por fim, a formação de um educador que seja capaz de ver o brincar com outros olhos é muito importante. Isso muitas vezes não se da no curso de pedagogia, a passagem pelo brincar é muito rápida e não aprofundada. Conclusão O título, usando a palavra poder, não foi algo aleatório. Realmente o brincar é um poder que qualquer criança pode ter. O desenvolvimento e o futuro da criança depende dessa brincadeira garantida. A criança é um sujeito de direito e ativo na sociedade em que vive. Garantido através de direitos e leis, a oportunidade de brincar. Além dos centro de educação formais, a sociedade também precisa garantir o direito do brincar. Dentro das brincadeiras assegurar oportunidades, um espaço, encorajamento, estímulos sociais dentro das brincadeiras, são o básico e garantem que a criança possa se desenvolver e conquistar habilidades físicas e emocionais. Referências JANET R MOYLES & cols. Excelência do brincar: a importância do brincar na transição entre a educação infantil e anos iniciais. RAMANSINI, Maisa - A primeira infância e o brincar . Disponível em: https://www.ipabrasil.org/post/a-primeira-inf%C3%A2ncia-e-o-brincar NONO, Maevi - Organização do tempo e do espaço na educação infantil Brincar promove diversos benefícios para o desenvolvimento infantil. Disponível em: https://ppagina.com/brincar-promove-diversos-beneficios-para-o-desenvolvimento-infantil-6883

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